-->

4 de setembro de 2015

"A nossa feira tem um papel de resgate cultural"

Entrevista com Satyavan Sat, representante do Instituto Biorregional do Cerrado (IBC) na Rede Pouso Alto Agroecologia e membro da Comissão Organizadora da V Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros



Por Shaonny Takaiama

Como surgiu a Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros?

A Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros surgiu em 2011, dentro de outro evento, era uma pequena iniciativa local, voltada para agricultores, coletores e o pessoal que trabalha com reflorestamento, que complementava a Feira de Produtos Sustentáveis do Cerrado. A primeira edição foi realizada pelo Centro UnB Cerrado. A segunda edição também foi realizada pela universidade e aconteceu junto com outros eventos da UnB, mas já era um evento independente, com horário exclusivo, após a Feira do Produtor Rural, no sábado à tarde. Esta edição contou com a participação das cidades circunvizinhas. 



Em 2013, a Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros ganha corpo e passa a ter mais dois dias. A programação passa a incluir cursos e oficinas. No ano passado, foram 4 dias de feira e o diferencial foi a inclusão de uma agenda cultural, com apresentação de filmes e atividades culturais sobre a temática das sementes e agroecologia.



Foi também nesta edição que aconteceu a primeira reunião de apresentação da Rede Pouso Alto Agroecologia, em que cerca de 50 pessoas estiveram presentes, entre agricultores, associações e lideranças comunitárias dos oito municípios que compõem o Território da Cidadania da Chapada dos Veadeiros.

Qual é a importância da feira para os produtores rurais da região e para a Chapada dos Veadeiros?

É a oportunidade de os agricultores terem acesso a variedades de sementes crioulas difíceis de se encontrar atualmente. Os agricultores perderam o costume de guardar as sementes para os próximos plantios, devido a industrialização das sementes a cada ano, o agricultor se vê obrigado a adquirir novas sementes para plantar.



Então, a nossa feira tem um papel de resgate cultural, resgatar a tradição de se preservar as sementes e a cultura da agricultura verdadeiramente tradicional, hoje conhecida como agricultura familiar. Hoje o que é tradicional é o que se tornou convencional, ou seja, a agricultura empresarial, baseada em  agrotóxicos e adubação mineral, mas na verdade a tradição da agricultura familiar brasileira é a agricultura das sementes da liberdade, as sementes crioulas. 



A partir do momento em que você plantou, colheu e guardou as sementes para o próximo plantio, você se vê livre do sistema de compra e venda das sementes industriais. Isso é uma articulação a nível planetário de aprisionamento da base alimentar da sociedade. Aprisionando a base da produção agrícola (sementes), você aprisiona toda a sociedade. Isto é realmente uma coisa assustadora. Este tipo de agricultura é uma agricultura empresarial. 

Já nós somos aqueles pequenininhos, que se rebelaram, que querem manter o cultivo tradicional de alimentos saudáveis. Muitos agricultores não têm as sementes, hoje, por exemplo, é raríssimo encontrar um milho crioulo, e lá na feira, o agricultor vai encontrar estas sementes. Nós queremos estimular os agricultores a irem à Feira, mesmo que eles não tenham outras sementes para trocar. O agricultor fica deslumbrado com a diversidade de sementes que ele encontra na Feira. 



Lá é possível encontrar sementes de chia, amaranto, cevada de fora do país (Tibet), milho e suas diversas variedades e dimensões que fogem do padrão, como o milho branco, vermelho, preto. Na Feira é possível também encontrar sementes silvestres nativas do Cerrado, diversas espécies de frutos, árvores protegida por Lei, como Aroeira, Jatobá, Mogno e Ipês. Temos também o arroz crioulo dos Kalungas (quilombolas), que cultivam suas sementes há mais de 300 anos, sem agrotóxico e sem mecanização. 



Eu comi um arroz verde super saboroso certa vez, colhido e destacado no pilão. Aí você vê o que é um arroz de verdade e porque ele veio a fazer parte da base alimentar de todos os brasileiros. Outras variedades importantes que os agricultores poderão encontrar na Feira são o feijões, roxo e vermelho, preto, roxinho, sementes de girassol, abóbora, quiabo, as batatas doces, inhame, carás, cara moela (do ar) e araruta, raízes bem raras hoje em dia.

Quantas pessoas participaram da última edição da feira?

Ano passado, nós tivemos 45 expositores de 8 municípios. Também participaram da Feira as instituições, ONGs, organizações públicas, comunidades kalungas, assentados da reforma agrária e outras associações. A irradiação que essa feira possui é bem ampla, pois os agricultores partilham as sementes entre si. A semente crioula percorre caminhos que a gente não imagina, esse é um papel bonito de disseminação da feira.



Por que é importante contribuir com a campanha na Kickante?

Como estamos em um momento de crise no Brasil, não contamos com recurso público para financiar a realização da Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros, diferentemente das outras edições. Este recurso que pretendemos arrecadar através do financiamento coletivo será usado principalmente na parte de Logística, para trazer os agricultores das oito cidades circunvizinhas que participam do evento, além de hospedá-los e alimentá-los. As doações servirão também para retribuir o trabalho voluntário dos envolvidos na organização da Feira. Este ano, nós só contamos com recursos do PPP-Ecos (retirados do PNUD, pelo Instituto Sociedade, População e Natureza-ISPN).

Além do crowdfounding, temos também buscado o apoio das prefeituras e institutos parceiros para a realização da feira.

Para apoiar a Feira de Sementes e Mudas da Chapada dos Veadeiros e fortalecer o movimento agroecológico,
entre e contribua: kickante.com/feiradesementes